Eu cresci numa família essencialmente católica - meus pais me criaram completamente sem rédeas quando se tratava de religião, mas era só eu chegar na casa dos meus avós que a situação era completamente diferente. De repente, eu me via sentada na frente do rádio-relógio do meu avô ouvindo o terço na rádio cristã (com 5 anos, querendo brincar e não entendendo nada daquilo). Fiz catequese por livre e espontânea pressão, ia nas missas só pra rir de quem era escolhido o coroinha ou a coroinha da semana, enfim, nunca me identifiquei com nada daquele hábitat, mesmo tendo que conviver com ele de vez em quando. O tempo foi passando, eu fui crescendo, lendo, aprendendo a me virar e, principalmente, criando opiniões e tendo indagações a respeito de todo esse sistema que é a igreja.
Eu simplesmente não consigo entender como um grupo tão grande de pessoas pode levar tão a sério um livro, e idolatrar tanto um personagem a ponto de tomar decisões pensando no que essa pessoa acharia disso... Além do mais, existem passagens da Bíblia que mostra que Deus é uma criatura que é ditatorial, um pai que espanca e assopra depois... E ainda assim, populações inteiras tocam os pés dos santos, pegam a água benta pra molhar os netos, choram em procissões... Isso só mostra o quanto a humanidade precisa de algo pra acreditar. O quanto as pessoas precisam ter algo a seguir.
E assim os padres vão lucrando e lucrando.
Não, não me crucifiquem. Eu admiro as pessoas que têm uma crença séria em algo. Mas eu só acredito em mim, nas decisões que eu tomo e nas consequências que eu recebo.
O catecismo me ensinou, na infância, a fazer o bem por interesse e não fazer o mal por medo. Deus me oferecia castigos e recompensas, me ameaçava com o inferno e me prometia o céu; e eu temia e acreditava.
Passaram-se os anos. Eu já não temo nem creio. E em todo caso - penso - se mereço ser assado cozido no caldeirão do inferno, que assim seja. Assim me salvarei do purgatório, que está cheio de horríveis turistas de classe média; e no final das contas, se fará justiça.
Sinceramente: merecer, mereço. Nunca matei ninguém, é verdade, mas por falta de coragem ou de tempo, e não por falta de querer. Não vou à missa aos Domingos, nem nos dias de guarda. Cobicei quase todas as mulheres de meus próximos, exceto as feias, e assim violei, pelo menos em intenção, a propriedade privada que Deus pessoalmente sacramentou nas tábuas de Moisés: Não cobiçarás a mulher do teu próximo nem seu touro, nem seu asno… E como se fosse pouco, com premeditação e deslealdade cometi o ato do amor sem o nobre propósito de reproduzir a mão-de-obra. Sei muito bem que o pecado carnal não é bem visto do céu; mas desconfio que Deus condena o que ignora.
Eduardo Galeano, em O Livro dos Abraços
Nossa! Adorei! "Espanca e assopra depois"... É exatamente por ter essa necessidade de acreditar q a humanidade criou deus (sim, deus, com letra minuscúla). Afinal, se nós humanos não existíssimos, deus tb não existiria. É ele q depende de nossa crença. Já dizia Raul: "não existe deus senão o próprio homem". Fala Raul!!
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